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A chacina de suzano como um projeto de sociedade

Março 13, 2019 - 23:46
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Por Guilherme Xavier

O massacre que aconteceu no dia 13 de Março de 2019 na escola estadual Raul Brasil, em Suzano – SP é extremamente simbólico, e reflete o quanto a escola pública abandonada é um projeto em relação às autoridades que governam o Estado desde sempre.
A chacina cometida por dois ex-estudantes da escola acabou por ter algumas vítimas, sendo dez pessoas mortas e mais outras nove feridas. Dentre as vitimas fatais estão estudantes e funcionários da escola.
É curioso que a imprensa geralmente foca emergencialmente e com prioridades as vozes de “especialistas” de segurança pública ou até autoridades desse setor das políticas públicas, ouvindo também comandantes das forças de repressão, como policiais.
O próprio secretário de educação do Estado de São Paulo também enfatiza a questão da “segurança” nas escolas, foca seu discurso de forma reativa e pouco se fala no diálogo com a comunidade escolar em si. Lembrando que quando tais governantes e autoridades do Estado falam em “segurança pública” leia-se aumento das forças policiais e repressão ostensiva.
Muito se fala de segurança pública e de resolver a questão somente no campo criminal, mas temos que aprofundar o caso com um caráter mais politizado e principalmente no campo da educação.
As escolas públicas em geral – principalmente nos âmbitos municipais e estaduais – vivem há décadas na seguinte situação: magistério desvalorizado, com salários em boa parte do país abaixo do piso nacional, péssimas condições de trabalho, escolas extremamente sucateadas, pouquíssimos funcionários para realizar tarefas cotidianas, salas superlotadas e em grande parte dos casos, não possuem climatização. Além disso, a pressão por resultados e tarefas extraclasses que também são pessimamente remuneradas (em alguns exemplos nem há remuneração por essas horas extras de trabalho).
Não é por acaso que nível de exoneração nas redes públicas de ensino a cada ano que passa aumenta, dados comprovam o alto índice de licença médica vinculados à profissionais de educação, sem contar os casos de suicídios que vem acontecendo na carreira docente.
Para acrescentar, temos uma juventude nas escolas que além das condições adversas locais e familiares, de extrema pobreza e violência, se submetem a esse cenário escolar calamitoso e lidam com professores e professoras adoecidos com frequência. Um ambiente que por conta de tudo detalhado acima possui docentes desmotivados, condições péssimas para o bom andamento das atividades escolares e que acabam por refletir em aspectos do cotidiano dos estudantes, como por exemplo, um alto nível de evasão escolar ou a reprodução de diversas formas de violência que vivemos e observamos no dia-dia em nossa sociedade.
O atentado de Suzano reflete uma série de fatores para analisarmos, mas os principais deveriam ser aprofundados no campo pedagógico, psicológico, da assistência social e não somente da chamada “segurança pública”, como parte dos jornalistas e autoridades do Estado buscam enfatizar.
Nas escolas do Estado do Rio de Janeiro, durante alguns anos tivemos um programa chamado PROEIS (Programa Estadual de Integração na Segurança) onde existia uma parceria entre a Secretaria de Educação e a Polícia Militar. Os agentes de segurança ficavam no pátio das escolas e circulando em espaços quando solicitados. O fato é que esse programa jamais resolveu a questão da segurança dentro das escolas, porém aumentou o constrangimento de estudantes e docentes terem que lidar com policiais de forma autoritária e num ambiente que não compete aos profissionais desse órgão do Estado estar presente.
A grande maioria das escolas públicas não possuem profissionais da área da psicologia, assistência social, além de todos os problemas estruturais que já identificamos como a falta de servidores de serviços administrativos, por exemplo. Vale mencionar aqui mais uma vez o caso das escolas do Rio de Janeiro que estão sem porteiros na grande maioria de suas unidades.
Volta e meia alguns jornalistas e outros “especialistas” citam a questão do problema de bullying de forma genérica como uma questão que precisa ser trabalhada. As questões referentes a bullying são diretamente ligadas a opressões em geral, só que no âmbito da juventude e ambiente escolar. Os debates feitos sobre opressões precisam ser realizados em diversos momentos que possam envolver a comunidade escolar, dentro e fora das unidades escolares.
Disciplinas como sociologia e filosofia são fundamentais para entendermos, aprofundarmos e esclarecer fora do senso comum a questão tão problemática que são os casos de bullying nas escolas. Essas matérias que de tempos em tempos são combatidas e arrancadas dos currículos regulares do ensino básico.
O grande perigo de não aprofundarmos o caso de Suzano (que não foi o único que aconteceu no país nos últimos anos) é mais uma vez estarmos tratando algo complexo de forma simplificada. Dando soluções que não são realizáveis em curto prazo, e no campo da educação, mas colocadas somente nas mãos da polícia e a segurança pública como resoluções imediatas. A questão estrutural da educação precisa ser debatida de forma séria e principalmente dando voz a quem está em sala de aula e nas escolas públicas em geral, sejam trabalhadores, trabalhadoras ou discentes em geral.
Enquanto não debatermos de forma aprofundada o projeto de esvaziamento, sucateamento e deterioração das escolas públicas, mais chacinas, suicidas e argumentos vazios, que exaltam armamento da população de forma institucional, irão aumentar e os filhos e filhas da classe trabalhadora que frequentam as escolas públicas irão seguir com seus futuros comprometidos, ao mesmo tempo que, a elite política e econômica do país seguirá intocável e ditando as regras, impondo privatizações de serviços públicos – já precarizados – e valorizando cada vez mais a propriedade privada, seus bens e relativizando a violência em locais da periferia, como sempre ocorreu.
Em tempos de avanço do pensamento conservador e reacionário, propagação de noticias falsas, perseguição a docentes que buscam fazer um trabalho baseado numa crítica social se afastando do lugar comum em seus colégios junto a estudantes e comunidades escolares, é necessário entender a conjuntura geral para irmos ao caso particular da chacina de Suzano.
Portanto, não será a partir do aumento de policiais cercando ou monitorando as escolas e seus entornos, tampouco com o aumento de medidas que liberem o uso de armas para a população, que iremos evitar casos como esse na escola Raul Brasil ou a violência nas escolas públicas em geral. Mas sim com valorização dos profissionais em sala de aula em todos os sentidos (econômicos, pedagógicos e condições de trabalho em geral), e investimento pesado em material humano ligados às questões de psicologia e assistência social, e de forma integrada, para começarmos a vislumbrar uma educação mais digna a todas as pessoas envolvidas no processo de ensino e aprendizagem.

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